Autoria:
Edson Amorim
Vou contar uma história
Que fala do João Pescador
Senhor bom e honesto
Do Pantanal é morador
Pra boa
prosa contar
E peixe grande pescar
Nisso é mestre e doutor
O João Pescador conheci
Em um mês de setembro
Numa pescaria que fiz
O ano eu nem me lembro
Mas nunca mais esqueci
E os casos que dele ouvi
Vez em quando relembro
Dele eu fiquei admirador
Como ficou a turma inteira
Viajando no Pantanal
Numas férias pesqueiras
Topamos lá o João no rio
Vendendo isca na beira
Recebeu bem a gente
E logo e bem de repente
Começou a converseira
João
conta casos variados
E não
fala uma besteira
Da ficção vai ao além
Em conversa bem ligeira
Casos melhores nunca ouvi
E na terra não conheci
Uma figura tão “verdadeira”
Não
digo que é mentiroso
Mas
sim um proseador
A estória
tá na mente
E não
mente o pescador
Nem
pede pra acreditar
Só quer ver
gargalhar
Os “alunos”
do “professor”
Proseador
e bom de papo
Debochado
e falando alto
Duma
ora pra outra
E num
rápido sobressalto
Trouxe
pra roda um caso
E
pegou todos de assalto
Então
o João já foi falando
E
todos ali assuntando
O que
aconteceu do fato
Disse que um dia à noite
Com seu Pai pescando
Viu bem no meio do rio
Uma luzinha piscando
Donde fumaça subia
Pra lá foram remando
E qual foi a surpresa
Era uma cobra boiando
Com a cabeça erguida
Um chapéu na cabeça
E um cigarro fumando
E a turma ficou pasma
Imaginando a cena
E o tamanho da cobra
Que não devia ser pequena
E caíram na gargalhada
Da estória pelo João contada
Que de “mentir” não teve pena
Mas nem bem ele acabou
Outra estória emendou
Dizendo que a tardezinha
Quando pro rancho voltava
Enquanto a canoa conduzia
Uma intuição teimava
Pedia que jogasse o anzol
Num poção que ele passava
Então cedendo à intuição
Uma grossa linha escolheu
Muito bem encastoada
Uma boa isca nela prendeu
E desenrolando a linhada
No poção então jogou
E nem no fundo chegou
Já sentiu a abocanhada
E a linha foi se esticando
Com um solavanco acochou
E a sua pequena canoa
Quase
que no rio afundou
E que ele ia “tocar gaita”
Pois era um peixe baita
Pelo peso imaginou
Então pensou ligeiro
E na prainha ancorou
A luta foi cansativa
Duas horas lhe custou
E usando o remo e a mão
Da água tirou o peixão
Que pela areia, ele rolou
Era um baita dum Jau
Duzentos quilos, calculou
E pelas suas lembranças
Foi o maior que ele pescou
Não dava pra embarcar
Teve então que carnear
E até seu couro tirou
E nenhuma foto tirou
E nem
folego o João tomou
Por
ter “pego” o peixão
Começou
essa do Jacaré
Que
por ali tem um milhão
E a
turma atenta, ouviu
E de medo
frio sentiu
Mas
não foi sua intenção
Contou que um certo dia
Coisa feia aconteceu
Um monstro dum Jacaré
De repente apareceu
Em pé, por cima d’água
Desembreado correu
Pro lado da sua canoa foi
Que nem remar tempo deu
Se equilibrando no rabo
Não acreditava no que via
A língua toda de fora
E os beiços até lambia
Na canoa João se encolheu
Um grito bem alto deu
E a sorte ficou à revelia
Ele chegou todo afoito
E comeu o que queria
Inda bem que tinha peixe
Senão, o João, ele comia
Mesmo
assim ele mirou
E dois
olhões arregalou
João
disse vixe Maria
Mas ao
terminar de engolir
Os
peixes que devorou
Nos
beiços deu uma lambida
E pra
ir embora se aprontou
João
achou que pastel virava
E estava
que nem piscava
Mas,
os céus, o ajudou
Então
com o bucho cheio
O bicho
desistiu e nadou
E
abanando o seu rabão
Num
mergulho, afundou
João tremendo
um bocado
E de medo
transpassado
Notou
que o calção melou /borrou
Depois
de muitas risadas
Outra do baú João tirou
Foi a estória da Jacaroa
Que seu Avô amansou
Uma estória engraçada
De pesca abocanhada
Do jeito que se passou
Disse que o Avô ficou amigo
De uma Jacaroa bonzinha
Que ele até o abraçava
E fazia nela cosquinhas
Era um Jacaroa de boa
Seguia sempre a canoa
Andando apressadinha
Seu Avô a canoa ancorava
Sob uma sombra no rio
Pra tomar um Tereré
E logo dava um assovio
E a Jacaroa já entendendo
Pela beira vinha correndo
Como nunca já se viu
Então a Jacaroa mergulhava
E sem demora já trazia
Um peixão de cinco quilos
E pro meu Avô oferecia
Era Jau, Dourado, Pintado
E outros dos mais variados
Isso era quase todo dia
E assim ele foi pescando
E mais e mais outro dia
Seu avô na vida mansa
Assim por tempos se ia
Ele nem mais pescava
E nem na vara pegava
Virou um preguiçoso que doía
Tanto peixe abocanhava
Que a canoa quase enchia
Mas a partir de certa data
A Jacaroa não mais ia
Pensou que ela enjoou
Ou julgou que o seu Avô
Sua ajuda não merecia
A ausência da boa Jacaroa
Deixou seu Avô chateado
Mas por ela ter sumido
Houve qualquer desagrado
Seu Avô ficou pensando
E acabou se lembrando
Que não dizia “obrigado”
João dos casos também ri
E um cigarro vai fumando
Acende o pavio da prosa
E sua estória vai narrando
É um humorista perfeito
Estória inventa de todo jeito
Pra turma ficar gargalhando
E esta estória que contou
Parece coisa inventada
Que só dá pra acreditar
Por amizade forçada
Mas entre as demais
Que foram contadas atrás
Esta é a mais acreditada
Disse que um dia de dia
Iscou uma viva piabinha
Arremessou na corredeira
E logo endureceu a linha
E começando a puxar
Pelo insistente repuxar
Sentiu que peixe vinha
E recolhendo a linha
Viu o Dourado saltando
E enrolando o carretel
Pra canoa foi puxando
Mas veio um Jau aloprado
Engolindo o peixe fisgado
Já quase ele embarcando
Foi obrigado a dar linha
Pois ficou muito pesado
Nisso um peixe grandão
Abocanhou os dois fisgados
E a linha quase estourando
Acabou três pescando
O Dourado, o Jau e o Pintado
Não tem como não gostar
Do seu estilo nordestino
É um ator contanto casos
Gesticula e fala vixe menino
João pra falar não tem enguiço
Acho que nasceu pra isso
E no palavreado é granfino
E essa que ele contou
Caprichou, caprichando
Uma estória extraterrena
De se ficar duvidando
Mas o caso foi tão bom
E pelo capricho do João
Eu acabei acreditando
Contou que pescando à noite
Entre os lagos avistou
Uma luz colorida e forte
Curioso pra lá remou
E corajoso, não desistiu
E chegando perto viu
Que era um Disco Voador
Era redondo e iluminado
A beira do lago pairou
E mais luzes acederam
A beira toda iluminou
Então duas portas se abriram
E dois Seres da Nave saíram
Por uma escada que baixou
Eram verdes homenzinhos
Com um grilão pareciam
Andavam desengonçados
Não falavam e nem sorriam
Tinha o corpo lambuzado
E os braços alongados
Eram feios que doíam
Um que desceu da Nave
Em sua mão pegou
E pra ele entrar na nave
Esse mesmo o convidou
Extasiado e sem medo
E sem fazer segredo
Na nave então entrou
E no aconchego da Nave
Perto da janela sentou
E por cima do Pantanal
Rasante a Nave voou
E por uma hora voaram
Depois então pousaram
No lugar que decolou
Gravaram sua voz cantando
A música “amor perfeito”
E ouviram ligeiro batendo
O coração no seu peito
E ele pôde até entender
Que as “coisas” queriam ver
E ele disse olha o respeito
Depois
em uma cápsula
João lá dentro colocaram
Mediram de todo o jeito
E tudo nele pesaram
E viu um deles anotar
Quem sabe pra estudar
O humano que encontraram
João os convidou pra descer
E pela terra andaram
E as belezas das lagoas
De perto admiraram
Até emitiram um chiado
Quando devem ter falado
Que dali eles gostaram
Um pouco da água pura
Num frasco eles coletaram
Na terra fincaram um tubo
E algumas gramas levaram
E João tendo permitido
Olharam sua boca e ouvido
E até seu sangue tiraram
E duas horas depois
Quando o ultimo embarcou
Com a Nave flutuando
Para o João um acenou
E rumo ao céu estrelado
Depois de ter decolado
O ufonauta acelerou
E pelos céus do universo
Num voejar inverso
A Nave então voou
Pela falta de uma máquina
João disse desconsolado
Pra nave e os
tripulantes
Ele ter
eles fotografado
E nos jornais pelo mundo
Assim seria comentado
Um pescador
pantaneiro
Teve encontro inusitado
Com dois extraterrestres
E com eles, até viajado
A lagoa que visitaram
De marciana é chamada
Lá uma vez por mês
Uma luz é avistada
João acha que nessa noite
A lagoa, por eles, é visitada
Ou então ela se tornou
Uma lagoa encantada
João não é de repetir
E no caso envolve a gente
Se vê que ele pensa ligeiro
Num roteiro fiel e prudente
Pois até pra bem mentir
E fazer o ouvinte rir
Tem que ser inteligente
E
esse foi mais um caso
Chegando
até a mitologia
Que
numa noite pescando
A
mente pra namorar pedia
E
por volta das dez e meia
Surgiu
das águas uma Sereia
A
mulher que tanto queria
Nadando
e sorrindo veio
E
na proa da canoa sentou
Disse
pra ele boa noite
E
pelo seu nome chamou
E
a luz clara da lua
Mostrou
a silhueta sua
Seu
belo corpo desenhou
De um olhar penetrante
Num rosto que Deus moldou
De cabelos pretos e longos
Imagem que o encantou
Um semblante sem tristeza
Era radiante em beleza
Que em sua mente gravou
E uma coisa ela pediu
Que era da sua missão
Pra que ele bem cuidasse
Daquele paraíso então
Pois nas águas ela morava
E nos rios e lagoas nadava
E que amaria sempre o João
E por uma hora e meia
Com ele na canoa ficou
E exato a meia noite
Seu encanto se quebrou
Depois de dar nele um beijo
E ele se extasiar em desejo
Em forma de luz, mergulhou
De “encantada” batizou a lagoa
Pois nas noites de lua cheia
Os peixes batem em cardume
Pensa ele, que é a Sereia
Com o cardume nadando
E dele, ela lembrando
Jura pelo sangue das veias
À noite quando ele dorme
Com a peixona fica sonhando
Uma morena duma sereia
Na proa do barco sentando
Aquela mesma quase mulher
Que com ele esteve falando
Imaginando ser verdadeiro
Amassa todo o travesseiro
Sonha, nela um beijo dando
Ouvindo essas boas do João
O povo não se aguenta
Quase se urinam nas calças
Como velhos de noventa
Gargalhando grita Ô loco
Foi de tirar pica pau do oco
De rir o pulmão arrebenta
Mas João não parou por ai
Disse que perto do planalto
Numa noite de lua cheia
Ele olhando para o alto
Uma coisa bem estranha
Lhe pegou de sobressalto
Um gigantesco Tuiuiú
Parecia estar de salto
Sobre uma árvore seca
Lá no meio do mato
Ele olhou atentamente
Pra não ficar imaginando
Disse, deixe de besteira
São dois Tuiuiús cruzando
E com o ninho nas costas
Devem estar se mudando
Ou podem ser que também
De outro estar roubando
O Raul tomando um gole
O Dé de olhos arregalados
E o Zael a carne assando
Com os ouvidos ligados
Pra não perder por nada
Um tiquim da prosa narrada
Sendo triste ou engraçado
E João já um pouco cansado
De tanto caso inventar
Disse esse caso é favorito
Não pensem em duvidar
E o caso da onça amiga
Arrumou com ele uma intriga
Assim começou a contar
Que uma onça conhecida
Seu nome era Bichana
No barranco ali parada
Cheia de ira e rosnona
Pra sua canoa olhou
E certamente o estranhou
Estava com fome a bichona
Ela deu um grande salto
E dentro da canoa pulou
E um enorme Pintado
Numa bocada já devorou
E do seu barco ancorado
Levou na boca um Dourado
E pela água, nadou
Disse: Sorte que ficou satisfeita
Pelos peixes então jantados
Senão teria que comer
Um homem mijado e cagado
Passei por aperto eu digo
Onça com fome é perigo
Aos céus disse obrigado
E pra casa foi assustado
Pelo tremendo acontecido
Nem pra trás ficou olhando
O remo na água foi atrevido
Nas onças não mais confiou
Nem muito se aproximou
Pois é um bicho mal benzido
Ouvindo o João Pescador
Seus tantos casos contando
Os companheiros de pescaria
As cenas ficam imaginando
O gorducho Amadeu
E o magrinho Zaqueu
Riram de ficar soluçando
Estórias o João contando
Numa ou outras versão
Fala um pouco de sua vida
Com dose certa de emoção
Uma lágrima nos olhos esfrega
E ao caso, de novo, se entrega
Pra não contrariar a razão
Se o tino na mente tá quente
Pra sua boca dá um sinal
Então logo vai começando
Sempre com seu bom astral
E vê que o povo está gostando
Vai então mais se animando
E o caso estica até bom final
Mas daí se tira a prova
Que pescador é aculturado
Inda tendo sangue nordestino
Nos gestos e palavreados
E assim desde menino
Deus já deu pra ele o tino
De um caboclo debochado
Na semana que lá ficamos
Ao lado do rancho acampados
Depois da pescaria do dia
Em volta da fogueira sentados
Ia até o dia amanhecer
Rindo da barriga doer
Dos casos pelo João contados
João foi nosso anfitrião
No rancho e nos alagados
Levava onde o peixe estava
E iscas, fornecia de bocados
E num astral espetacular
Nem se viu os dias passar
De bom humor renovados
Depois que em casa cheguei
E dos casos relembrando
Me peguei rindo sozinho
E sua voz parecia escutando
E às estórias fantasiosas
E as tantas outras prosas
Fiquei ali recapitulando
Pescamos e divertimos
Tomando uma gelada
Comendo peixe assado
A alegre rapaziada
O estresse foi embora
E só nos resta agradecer
Ao amigo João camarada
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